Uma “boa” herança da era PT e do governo Dilma: uma lista do que não fazer em Ciência e Tecnologia
Levantei, com o auxílio da repórter Talissa Monteiro, uma série de presepadas do último governo federal nas áreas de Ciência e Tecnologia. A intenção: montar uma lista com algumas dicas do que não fazer, para o próximo governo que teve início há pouco – e para quem for que assumir em 2018. Não usar o […]
Levantei, com o auxílio da repórter Talissa Monteiro, uma série de presepadas do último governo federal nas áreas de Ciência e Tecnologia. A intenção: montar uma lista com algumas dicas do que não fazer, para o próximo governo que teve início há pouco – e para quem for que assumir em 2018.
- Não usar o conceito de inovação apenas como marketing, para angariar votos na campanha. Explico: em 2014, uma das promessas de Dilma Rousseff, ainda candidata à reeleição, era construir o que chamava de “sociedade do conhecimento”. Seria um Brasil com menor burocracia e fomentador das áreas de ciência e tecnologia. Lindo, não? Na prática, naufragou – e, há dois anos, era fácil deduzir isso. Em abril, o Ministério da Ciência e Tecnologia teve seu orçamento reduzido em 25%, para R$ 3,3 bilhões, o menor dos últimos 12 anos. Em consequência, o CNPq suspendeu a concessão de bolsas no exterior, a Capes também congelou 7 408 ações de incentivo a estudantes e a Faperj sofreu corte de 50% de seus recursos. Todos, órgãos ligados à tal “sociedade do conhecimento”.
- Não aprovar pílulas ditas milagrosas como se fossem remédios infalíveis. Só quem não leu notícias nos últimos meses não sabe do que estou falando: a tal pílula do câncer. Em abril, em clara jogada populista, Dilma sancionou o uso da fosfoetanolamina sintética. Isso sem levar em conta pareceres técnicos, vindos de seus próprios ministérios (vários deles), que pediam que a presidente vetasse integralmente o projeto. Motivo? Simples. Por enquanto, é apenas crendice a conclusão de que a tal pílula de fosfoetanolamina auxilia no combate ao câncer. Mas qual seria o mal disso, poderiam perguntar? A questão é que, por não ter enfrentado avaliações científicas adequadas, também não se sabe dos potenciais malefícios de se consumir a droga. Ou seja, quiseram liberar no mercado uma substância química que ninguém sabe direito o que faz…
- Não permitir o acesso grátis da população a apenas alguns serviços de internet, agredindo, dessa forma, o conceito básico de neutralidade da rede (ou se libera tudo, ou nada, para não correr o risco de privilegiar apenas “parceiros”, “amigos”, o que o político da vez acha propício). O governo de Dilma tentou isso de variadas formas, como no apoio ao criticado projeto internet.org, do Facebook.
- Não tentar criar leis protecionistas em relação à internet, uma rede global. O PT flertou com essa estratégia em diversas situações, como quando pensou em exigir que multinacionais, a exemplo do Google e do Facebook, armazenassem dados de usuários nacionais em data centers no país. A medida não impediria a espionagem estrangeira (a falha desculpa do governo para tentar que isso vingasse), nem conseguiria manter usuários em território brasileiro (outra justificativa arcaica). No fim, só faria uma coisa: espantaria essas empresas do Brasil e, logo, serviria de bloqueio para o desenvolvimento da web no país.
- Não apoiar projetos de aliados na Câmara (do último governo, à época; e, hoje, do de agora) que visam, na prática, tão-somente, punir quem fale mal de político na internet.
- Parar de dar fim a incentivos fiscais para a venda de smartphones, tablets e computadores. Motivo: o barateamento dos gadgets ajudaria a desenvolver empresas e a levar o novo mundo, o da internet, para populações mais pobres. Indo na contramão, o governo achou que taxar esse setor seria uma boa ideia.
Não seria difícil estender essa lista, convenhamos. Contudo, se o atual governo de Michel Temer (e todos os que vierem) simplesmente atentarem aos pontos acima, e pararem de encarar a inovação como marketing, não como o bom motor da sociedade (o que é, de fato), já estaria de bom tamanho.
Há exemplos claros de como a ciência brasileira está sucateada. Em 2013, quando visitei a Organização Europeia para Pesquisa Nuclear (Cern), sede do acelerador de partículas LHC, na Suíça, uma leva de pesquisadores brasileiros que lá estavam me chamaram para realizar uma “reclamação”. O que queriam? Eles se queixavam do seguinte: o governo federal dizia, propagandeava, que os apoiava; porém, passava meses sem enviar dinheiro a eles (ou seja, ficava devendo). “Se não fosse a ajuda do Cern, que nos dá salários ‘por fora’, passaríamos fome aqui”, afirmou, então, um desses cientistas – que pediu para não ser identificado, por óbvio medo de represálias.
Recentemente, pesquisadores da USP e da Unicamp têm me ligado reclamando de uma série de apoios financeiros que nunca chegam do governo federal. Ok, tem a crise aí. Porém, são, novamente, aportes prometidos e propagandeados pelo governo. Frente a esse cenário deplorável, cientistas de ponta, a exemplo da neurocientista Suzana Herculano-Houzel, se deparam com a necessidade de deixar o país. Em artigo para a revista Piauí, Suzana destacou como nunca teve verba liberada para uma série de seus projetos, que já tinham financiamento aprovado, e como, no país, cientistas improdutivos acabam por terem os mesmos salários dos melhores nomes da área. Resultado: ela zarpou, para a Universidade Vanderbilt, nos EUA.
O cenário pode ser revertido? Sim, sempre. Ainda mais quando se fala em inovação. Amanhã, por exemplo, o Supremo Tribunal Federal votará se suspende a tal pílula do câncer, ou se segue com sua aprovação. A decisão já será um sinal de para onde andamos.
Aliás, na área de saúde o governo de Temer não começou bem. Frente à polêmica da pílula, o que disse o novo ministro, Ricardo Barros? “A fé move montanhas”. Desde o Renascimento a humanidade aprendeu que não é receitado misturar crença com ciência. Ainda mais quando no cerne está o tratamento de uma doença, como o câncer.
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