QUAL SERIA “O VALOR DE UM HOMEM” EM TEMPOS NEOLIBERAIS?

Por Celso Sabadin.

Em tempos em que o fantasma do neoliberalismo volta a assombrar a economia é bastante oportuna a estreia de um filme cujo título original é “A Lei do Mercado”. No Brasil, a obra foi traduzida como “O Valor de um Homem”, mas o princípio básico é o mesmo: quanto valemos quando prevalecem as injustas e cruéis leis do mercado? Com certeza, nada.

Thierry (o sempre ótimo Vincent Lindon) é um cinquentão desempregado buscando uma sobrevivência digna numa Europa assolada pela crise. Certamente o tema não é novidade, mas a maneira como ele é conduzido pelo diretor e roteirista Stéphane Brizé é de gelar a espinha: com a mais paralisante perplexidade. De diferentes formas, o protagonista vivencia ou apenas presencia momentos do mais agudo constrangimento, reagindo a eles com um tipo de emoção contida que nos deixa com as unhas cravadas na poltrona do cinema. O grito não sai, a raiva não explode, toda a humilhação do mundo vai sendo engolida a eco. Thierry é um vulcão que não explode. Este homem do século 20 que tenta sobreviver no 21 agora é uma casca consumida, mastigada e cuspida pelas tais “lei de mercado”.

Seja numa cerimônia fúnebre, numa longa cena em que tenta aprender a dançar, ou no trato de seu filho que necessita de cuidados especiais, sua fisionomia é sempre a mesma: distante, pensativa, sufocada. Como sufocante é o filme, sem janelas, sem portas abertas, sem nenhum tipo de visualização para qualquer tipo de horizonte. Claustrofóbico

Uma cena em particular já pode ser considerada antológica: a análise que  “especialistas” em relações humanas (humanas?) fazem do desempenho de Thierry durante uma entrevista de emprego.

Com longos planos de silêncio que convidam à introspecção e à reflexão, “O Valor de um Homem” compõe um retrato duríssimo e atual da hipocrisia que rege as relações de trabalho.  Lindon ganhou o César e o prêmio de melhor ator em Cannes pelo filme, que estreia no Brasil em 26 de maio.