Jornal da ABI 357

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DEPOIMENTO

“Tenho mais de mil perguntas, e não quero ouvir as respostas”. A frase, por si só bastante curiosa, torna-se ainda mais intrigante quando identificado seu autor. Faz parte de um artigo assinado por um iniciante Geneton Moraes Neto. Foi publicada em setembro de 1974, no experimental O Outro, fanzine editado por um grupo de estudantes da capital pernambucana. Quase quatro décadas depois, o jornalista tornou-se referência na arte de entrevistar. De provocar. Sabe fazer as perguntas. E apurou um ouvido afiado para decifrar as respostas. O título desta entrevista, menos que uma brincadeira, é uma referência ao trabalho de Geneton. Muitos de seus livros trazem o termo ‘dossiê’ na capa. É justo. Suas obras costumam revelar em detalhes, e com altas doses de ineditismo, os pensamentos e perfis até então ocultos dos entrevistados. De Carlos Drummond de Andrade a Fernando Gabeira. Dos exPresidentes da República José Sarney, Fernando Collor, Itamar Franco e Fernando Henrique Cardoso – todos publicados no Dossiê Brasília. Além dos bastidores de episódios históricos, como a Copa de 1950. Como a entrevista feita por ele com Drummond, nosso papo, na sede da TV Globo, no Jardim Botânico, durou mais de duas horas. Ainda assim, exigiu breves contatos posteriores, para complementar a apu-

A trajetória e a técnica de um jornalista que se define como um “agente provocador”.

POR PAULO CHICO E FRANCISCO UCHA 36 Jornal da ABI 357 Agosto de 2010

FRANCISCO UCHA

ração. Como entrevistado, Geneton é menos objetivo do que como entrevistador. Por vezes, parece escapulir das perguntas. Sua narrativa é marcada por desvios de rota e interrupções. Nada intencional, que fica bem claro. E absolutamente natural para alguém que, ao longo de tanto tempo de ofício, colecionou boas histórias. E não perde o hábito de querer contá-las. Uma das polêmicas definições apresentadas pelo repórter, atualmente na Globo News, dá conta de que fazer Jornalismo é tornar, por meio de criteriosa edição do material bruto, as pessoas mais interessantes aos olhos do público. Para isso, o desafio é destacar o que nelas há de mais especial e marcante. Cá entre nós, no caso desta entrevista com Geneton, tal missão até que foi fácil. Torná-lo um personagem interessante é tarefa que não exige sacrifício. Aproveite você também. Boa leitura.


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