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Santa Casa de São Paulo fecha emergência
Em crise financeira, maior hospital filantrópico da América Latina deixa de receber pacientes no pronto-socorro
'Não tem seringa, soro e esparadrapo', diz provedor da instituição, que responsabiliza os diversos governos
Em crise financeira e pressionando por recursos do poder público, a Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, maior hospital filantrópico da América Latina, interrompeu os atendimentos de urgência e emergência no final da tarde desta terça-feira (22).
O pronto-socorro, que realizava 1.500 atendimentos por dia nas áreas de clínica-geral, pediatria, ortopedia e ginecologia, deixou de receber novos pacientes e só manteria os serviços às 140 pessoas que já estavam internadas.
A Santa Casa diz ser a segunda vez na história em que suspende atendimentos --a outra havia sido quatro décadas atrás. Trata-se do hospital mais antigo da cidade de São Paulo, aberto em 1884.
A instituição afirma que suspendeu atendimentos por não ter recursos para comprar medicamentos e materiais, principalmente devido à desatualização da tabela de repasses do SUS para bancar procedimentos médicos.
"Não temos dinheiro para remédio. Onde preciso comprar 100, só consigo 50. Não tem seringa, soro e esparadrapo", disse Kalil Rocha Abdalla, provedor da Santa Casa.
Sem aviso prévio, pessoas que precisavam de atendimento médico foram barradas logo depois das 18h --com algumas exceções.
O hospital deve R$ 50 milhões a fornecedores que se negam a entregar encomendas. Abdalla afirmou que, além do pronto-socorro, há 700 leitos com gente precisando de tratamento e que há risco de tudo ser fechado.
"Não temos condições de atendê-los bem, como sempre fizemos. Já comunicamos ao Samu e ao resgate para que evitem trazer mais pacientes."
O provedor afirmou que "a culpa é das autoridades" das diversas esferas de governo.
"Estou esperando verba, peço para governador, prefeito, ministro. E não vem", afirmou Abdalla.
"Mantenho contato permanente com todas as autoridades. Mas tenho a impressão que eles imaginavam que eu estava blefando."
O Ministério da Saúde e a Secretaria Estadual da Saúde divulgaram notas dizendo tomar providências.
A prefeitura afirmou que procurou a instituição para oferecer medicamentos.
Além da falta de dinheiro, situação comum na maioria dos hospitais públicos e filantrópicos do país, há questionamentos sobre a gestão dos recursos pela Santa Casa.
A discussão veio à tona em abril, na eleição para provedor, quando Abadalla foi reeleito pela terceira vez.
O hospital, com orçamento de R$ 1,3 bilhão, tem dívida de mais de R$ 350 milhões --com juros de quase R$ 3 milhões por mês. Há seis anos, quando Kalil assumiu, a dívida era de R$ 70 milhões.
"É a crônica da morte anunciada. Esperava que isso fosse acontecer, mas não com essa velocidade", disse José Luiz Setúbal, que concorreu na chapa opositora à de Kalil e que é presidente do Hospital Infantil Sabará e conselheiro da Santa Casa.
"Todo mundo sabe que o SUS paga mal. Por isso, tem que ter gestão profissional, bom planejamento", disse Setúbal, que questiona a falta de detalhes, por exemplo, sobre os cerca de 700 contratos de aluguel de imóveis que a entidade tem na capital.
Kalil nega problemas de gestão, diz buscar fontes de recursos e fazer rígido controle de custos.