Disco: “Thiago França”, Passo Torto & Ná Ozzetti

/ Por: Cleber Facchi 19/08/2015

Passo Torto & Ná Ozzetti
Nacional/Experimental/Rock
http://www.passotorto.com.br/

A banda paulistana Passo Torto parece maior a cada novo álbum de estúdio. Guitarras, linhas de baixo, vozes e versos cada vez mais sujos, imponentes e invasivos. No caso de Thiago França (2015, YB), terceiro registro de inéditas do coletivo, um projeto que cresce não apenas em sensações, novos conceitos e cruzamentos de ritmos, mas também em relação ao número de integrantes. Além do time formado por Kiko Dinucci, Rodrigo Campos, Romulo Fróes e Marcelo Cabral, a interferência direta da voz (e sentimentos) da “convidada” Ná Ozzetti.

Dona da voz que invade e sustenta grande parte do trabalho, Ozzetti está longe de parecer uma estranha quando próxima dos demais integrantes da banda. De fato, boa parte dos conceitos e temas explorados no presente disco sobrevivem como uma espécie de sequência em relação ao material apresentado no álbum Embalar (2014), último trabalho solo da cantora e registro que conta com a presença de Kiko Dinucci – além da parceira Juçara Marçal – em determinadas composições.

A relação da cantora com o extinto Grupo Rumo – projeto em que atuou como vocalista desde o meio da década de 1970 -, também é outro importante fator para o novo trabalho ao lado da Passo Torto. Quem acompanha o projeto da Passo Torto desde a estreia em 2011 sabe do confesso interesse de Fróes, Dinucci e demais integrantes pelo acervo de obras que definiram a Vanguarda Paulista no começo dos anos 1980. Com a chegada de Ozzetti, o nascimento de um trabalho que não apenas presta homenagem ao período, como estreita ainda mais a relação da Passo Torto com o movimento.

Ambientado no mesmo universo urbano que apresentou o grupo há quatro anos, Thiago França – o nome do disco é uma brincadeira com o saxofonista de mesmo nome, parceiro do grupo e integrante de projetos como Metá Metá e Sambanzo – é a obra em que o coletivo paulistano mais expande o próprio domínio lírico e musical. Um exercício criativo de “experimentar o experimental” sem necessariamente desconstruir a base criada nos últimos registros de estúdio.

Em se tratando dos arranjos, a busca por um som climático, sujo, ainda que detalhista. Ao mesmo tempo em que as guitarras de Dinucci costuram todo o acervo da obra, difícil ignorar a presença dos demais instrumentistas. Em Perder Essa Mulher, por exemplo, segunda faixa do álbum, o completo domínio do baixo assinado por Marcelo Cabral, instrumento movimenta todo o restante da faixa. Sobram ainda ruídos de violão e a voz grave, atmosférica, de Fróes, “instrumento” que ocupa as pequenas lacunas deixadas por Ozzetti. O próprio ruído vocal em Cipó funciona como um poderoso mecanismo para a primeira faixa do disco, poluindo de forma propositada o fundo da canção e servindo de base para a sequência de vozes e captações sujas que atravessam o restante do álbum.

Talvez efeito da presença de Ozzetti, Thiago França cresce como o registro mais delicado e intimista de toda a (curta) trajetória da Passo Torto. Basta um passeio pela melancólica Palavra Perdida, faixa dominada pela voz e arranjos brandos, para perceber a explícita transformação do grupo. Quando próximo do antecessor Passo Elétrico (2013), o novo disco soa como um catálogo de composições entristecidas, por vezes lentas, versos que escapam do caminho frenético assumido há dois anos para mergulhar em angústias (O Cinema É Melhor) e personagens naturalmente maquiados pelas metáforas (Beth, Cipó).

Thiago França (2015, YB)

Nota: 8.3
Para quem gosta de: Metá Metá, Jussara Marçal e Rodrigo Campos
Ouça: Perder Essa Mulher, O Cinema É Melhor e O Cadáver

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.