Neste próximo sábado, Wanderlei Silva voltará ao cage depois
de exatos 1332 dias distante de uma luta profissional. Foi no longínquo dia 3 de março de 2013 que o "Cachorro
Louco" fez sua última luta no MMA, ainda no UFC, quando venceu Brian Stann.
Agora, o desafio será encarar o desafeto Chael Sonnen, em nova casa: o
Bellator. O brasileiro e o americano farão a luta principal do card de número
180, na mítica arena do Madison Square Garden, em Nova York.
Em entrevista exclusiva ao Combate.com, Wanderlei não
escondeu a ansiedade por voltar a lutar e revelou ter passado por um período de depressão quando pendurou as luvas.
- Realmente foi muito difícil esse período fora. Imagina
qualquer trabalho que você tenha: você acorda e tem sua rotina, e eu tinha
minha rotina desde os 13 anos. Acordava, ia para a academia, tinha um próximo
oponente, um próximo evento, e de repente acabou. Acordava de manhã, tinha uma
casa bonita, carro, dinheiro, mas não tinha o que fazer. Viajava bastante,
tinha bastante seminários, mas isso é um bico, não é um trabalho fixo. Nunca
fiquei sem lutar. Então, tive um período muito difícil, tive muita depressão,
fiquei em casa... Mas tive um grande suporte da minha esposa, dos meus filhos.
Dava uma aula aqui, uma aula ali, mas não tinha algo fixo para fazer. Foi
realmente um período muito difícil. Essa volta aos ringues tem sido para mim
como uma grande terapia.
Ao falar do hiato na carreira, Wand lembrou a desavença
que o fez deixar o Ultimate e anunciar a aposentadoria, em setembro de 2014. À
época, ele fugiu de um teste antidoping surpresa justamente antes da luta contra Sonnen -
com quem fez o TUF Brasil 3 -, e então começou uma batalha contra a organização e seu presidente, Dana White.
- A aposentadoria foi uma aposentadoria entre aspas,
forçada. Me desentendi com o antigo dono do evento, rolou tudo aquilo, e parei
com 49 lutas. E o pessoal perguntava: "Por que parou?". Parei porque
não estava mais a fim de lutar para aquela organização. O pessoal fala:
"Qual o meu sentimento por Dana White?". Dana White é um grande
empresário, e quando dois leões se encontram rola briga, e rolou um
desentendimento normal. Respeito ele, é um grande empresário, mas ficou melhor
cada um na sua. E ele teve uma grande atitude de me liberar do contrato para
que tocasse minha vida, e deixar o Wanderlei Silva fora dos ringues é um crime.
Logo que tive a liberação do antigo evento, o Bellator e o Rizin já entraram em
contato comigo e me fizeram ótimas propostas para voltar a lutar. Me foi
oferecido para lutar no final do ano, mas em dezembro não pude, não estava
pronto ainda devido à minha lesão, e agora no meio do ano deu a arena certa, o
oponente certo e agora estou aqui.
A primeira luta profissional de Wand foi em 1996. Exatos 21
anos depois, ele atingirá a marca de 50 lutas na carreira,
que tem 35 vitórias, 12 derrotas, um empate e uma luta sem resultado. O duelo
com Sonnen é encarado por ele como um recomeço.
- Estou muito emocionado. Acho que o oponente está à altura,
a arena não poderia ser melhor. Chamam o Madison Square Garden como a “arena
mais famosa do mundo”, do mundo das lutas, voltar fazendo uma luta principal é um grande teste. Estou há quatro anos fora, estou treinando,
treinando bem, mas treino é treino e luta é luta, e sei disso. Quando você
entra para valer, a emoção é outra. Já lutei em várias arenas do mundo todo
desde os meus 13 anos, arenas pequenas e arenas gigantescas, e estou encarando
isso como um recomeço, uma reestreia, e estou encarando também como um presente
que estou dando para os meus fãs. Esta vai ser minha luta de número 50, no Madison
Square Garden. Garden é jardim (em inglês), é o jardim dele, porque óbvio, o
americano é muito patriota, por isso que o (Donald) Trump se elegeu. Tenho certeza que
aqui vai rolar um grito de "U-S-A", mas aí no Brasil sei que vai estar todo
mundo torcendo por mim, mandando aquele pensamento positivo. Wanderlei Silva
está de volta para realmente fazer a alegria do povo (...). Quero agradecer a
torcida de todos vocês, espero que vocês vejam o combate de sábado. Vou lá
surrar o Sonnen, na casa dele! Aqui a torcida pode ser dele, mas sei que você
aí (no Brasil) vai torcer para o Silva.
A luta com Chael Sonnen é um capítulo à parte na história de
Wanderlei Silva. Os dois trocaram farpas durante todo o TUF Brasil 3, em 2014, e
chegaram às vias de fato, quando o americano chegou a derrubar o brasileiro
durante uma briga nas gravações. O Cachorro Louco não esqueceu de nada disso, e
promete “cobrar a conta” logo mais.
- A hora que fechar a grade, a gente vai ver qual é. Vamos
resolver essas desavenças, e sem dúvida essa luta é um grande presente
para o público, é uma das últimas rivalidades reais que a gente vê no mundo do
MMA. O pessoal fala: "Mas tudo aquilo era verdade?". Claro que é
verdade, e quem começou foi ele, quem encostou a mão primeiro no outro foi ele,
foi ele que me empurrou, que me derrubou lá na frente de todo mundo. Na
verdade, ele é quem está devendo para mim, e vou acertar essa conta no sábado.
Vai ser uma luta imperdível. Vai ter a luta do Fedor, duas disputas de título,
então está um evento imperdível. O Bellator é tido como o segundo maior evento
do mundo (no MMA), mas está todo mundo dizendo que no sábado, com a luta do
Wanderlei Silva, vamos ser o número 1 - prometeu.
No bate-papo, Wand ainda fez elogios a Cris Cyborg, declarou que gostaria de enfrentar Fedor Emelianenko no futuro e se disse satisfeito com o reconhecimento dos lutadores mais jovens.
Confira outros trechos da entrevista de Wanderlei Silva:
"A Cyborg é o Fedor do MMA feminino"
- Nada mais justo do que a Cyborg disputar agora esse cinturão
do UFC. Ela deveria ter começado na categoria dela (no peso-pena) e terem começado
por ela (a divisão), porque ela é a maior lutadora de todos os tempos. Ela é o
Fedor das mulheres, faz dez anos que não perde, a única luta que ela perdeu até eu que estava no córner. A gente colocou ela para lutar e a garota estava no
chão e chutou a Cyborg, ela caiu no chão e machucou o braço. A Cyborg acabou
perdendo, tadinha. Depois disso, ela teve uma carreira avassaladora, é a
melhor de todos os tempos, é uma mulher que deixa até a gente mal de cabeça. A
gente acorda e às 11h vê o Instagram da Cris e ela já fez ferro, manopla,
jiu-jítsu, wrestler e já está indo fazendo uma corridinha (risos). Para vocês
verem que, quando uma mulher quer, uma mulher decidida, uma mulher determinada,
ela dá de dez no homem. E a Cyborg é a prova disso. De todos os atletas que
conheço, e conheço muitos atletas, a Cyborg sem dúvida é a que mais treina. Não
é que ela é um fenômeno, mas ela treina, o segredo é esse. Quem aguentar fazer
o que ela faz, vai ser tão bom quanto. Ela é malvada também, pega as gurias e
desce o sarrafo (risos). Até gostei muito da atitude dela com essa garota que
se folgou com o marido dela, que ela foi lá e "arrancou" o dente da guria.
Possível luta com Fedor Emelianenko
- Isso é uma coisa que estava me perguntando esses dias. Na
época que eu era tido como melhor do mundo e ele também, o pessoal falava:
"Por que você não lutou com ele?". Porque essa luta nunca me foi
oferecida, nunca ninguém falou: "Quer lutar com o Fedor? Luta com o
Fedor". E, sem dúvida, acho que seria uma luta interessantíssima, aceitaria
lutar com ele, porque é um cara que respeito, é uma lenda, e quero me testar. Lutar com os grandes que ainda estão na ativa é um presente para os fãs.
Estava com o Royce (Gracie) agora de manhã, e falei que vi o Royce lutar com o (Ken) Shamrock, e dizem "Ah, a luta não foi tudo aquilo", mas vi os caras
lutarem, vi os caras entrarem no ringue, os caras se digladiando na idade
deles. Isso é uma coisa que está acontecendo mais agora, e estou muito feliz de
poder ver que está sendo dado um bom palco bom para nós, que estamos
conseguindo fazer os grandes clássicos. Quando o cara consegue chegar nesse
patamar - estou com 40, vou fazer 41 anos - e consegue estar competindo,
realmente é algo que tem que ser visto. E espero ter a performance que
realmente o pessoal espera. Estou muito bem treinado, estou saindo na mão com a
rapaziada. Faz seis meses que estou tomando amasso na academia (risos), agora
vou me vingar do meu oponente no sábado. Mas considero (Fedor) o melhor de
todos os tempos. Nessa luta agora vai pegar um cara mais jovem, o oponente dele
não é bobo, é tão grande quanto ele, é uma luta dura, e ele está aí botando a
cara para fazer. Quando o cara tem o saco de continuar treinando e competindo,
a gente tem que realmente enaltecer.
Legado e reconhecimento dos ídolos atuais
- Se for deixar algum legado é o da raça, da perseverança,
da força de vontade. Eu fico muito feliz de os ídolos de agora, Jon
Jones, Georges St-Pierre, chegarem para mim e dizer: "Comecei a treinar por causa
de você, comecei a treinar vendo suas lutas". Vejo lutadores novos
copiando estilo, dizendo que querem ser iguais ao "Cachorro Louco".
Acho que fui um dos primeiros atletas a lutar e virar estrela junto com
Sakuraba, na época Pride, um dos maiores eventos do mundo. Fui um dos primeiros
a ter a vida toda dentro do ringue, isso é uma coisa difícil, mas não é
qualquer um. Por isso que fico muito feliz quando vejo a rapaziada jovem indo ali e
fazendo o seu melhor. Gostaria muito de ver o nosso esporte chegar no patamar
que merece. A gente deu um “up”, aí dá uma descida, a gente fica nesse sobe e
desce e vejo muita gente com 30 anos já parando. Vê o cara lutando e, de
repente, está com o carro quebrado, numa academia pequena... Não é nesse
patamar que queria ver o esporte. Queria ver a rapaziada bem, cuidando da sua
família, com academia bonitas, ou com o burro na sombra, com o pé de meia feito.
Tem muita coisa que os lutadores de MMA têm que aprender, e uma delas é
aprender a lidar com o dinheiro. Meu pai dizia que o dinheiro foi feito para
guardar. O cara ganha US$ 50 mil dólares e depois compra um carro de US$ 40 mil.
Aí se aperta e vende o carro por US$ 20 mil. Você tem que guardar o dinheiro
porque não sabe o dia de amanhã, você não sabe quando vai lutar. Não existe
carreira mais incerta que a de lutador. Você luta agora, perde duas, três e não
sabe o que vai acontecer com você. Toma um azar, uma invertida como aconteceu
com o José Aldo, mas o Aldo é o Aldo, junto com o Fedor são os melhores da história, e aconteceu o que aconteceu. Se o Aldo não fez o pé de meia dele,
o que acontece? E o Renan Barão? Ganhou 32 lutas seguidas e ficou rico, ou não ficou?
A gente tem que aprender com o erro e acerto dos outros. Se for deixar um
legado é que aprenda a usar bem o seu dinheiro, compre um terreno, faça uma
casa... Nesses quatro anos que fiquei parado ninguém foi bater na porta e perguntar se eu estava precisando de alguma coisa, e as contas continuam chegando.
Graças a Deus, sempre fui muito mão de vaca, quem me conhece sabe disso,
economizei todo o dinheiro que ganhei, e posso agora lutar porque gosto.
Existe um lado positivo do Sonnen?
- Achei bonito o filho dele, vi o filho dele por aí esses
dias, para não dizer que não gosto de nada dele (risos). Na verdade, tirando a
rivalidade em si, o cara se promove bem. A gente não pode menosprezar ninguém,
mas dentro do nosso meio o cara começou a se promover, começou a promover
melhor as lutas e isso é bom para nós. Tenho uma rivalidade pessoal, mas temos
que pegar o que tem de bom. O da vez agora é o McGregor, que sabe promover a
luta dele, sabe mexer com o oponente na hora certa. Você que é lutador,
realmente se for te dar uma dica, nós não somos pagos para ser educados, somos
do bairro, somos da vila, como a gente chama. Vamos ser polidos agora? Não. Se
você tem um oponente, olha no olho. Fala, com toda a educação, que você vai
quebrar a cara dele. Não custa nada, é um jeito de você apimentar a luta, de
realmente fazer as pessoas quererem ver o seu combate. Você tem que encarar a
luta com seriedade, olhar seu oponente e falar: "Agora é o seguinte, vou
te pegar!".Fechou a grade, o mais difícil nós fazemos, que é sair na
mão. Para que a gente cresça, a gente tem que ter mais audiência. Para ter mais
audiência, cada lutador, de cada evento tem que saber fazer sua parte. Em todas
as áreas. Se for copiar alguma coisa dele, fale a coisa certa na hora certa.
Acidente e acerto com o Bellator
- Tive um acidente gravíssimo quando fui atropelado de
bicicleta no Brasil. Estava andando de bicicleta na América, na Califórnia, e aí
levei a bicicleta para o Brasil e achei que era a mesma coisa. Comecei a andar de
bicicleta no Brasil até comprar um carro, e realmente isso que é muito triste. No Brasil, as ruas são muito estreitas, e o cara passou e me atropelou e foi
embora. Foi um imprevisto, acho também que ninguém atropela por querer, o cara
pode ter se assustado e saiu correndo. Viu que era o Wanderlei Silva e saiu
correndo (risos). Mas realmente tive uma lesão no ombro e no joelho, por isso
que não lutei em dezembro. E por isso que é bom ter amigos. O pessoal do Japão
(do Rizin) me ofereceu e eu estava machucado, mas estava voltando a treinar,
não estava 100%, e meu professor falou: "Mas você vai sair da lesão para a
luta?". Falei: "Mas o pessoal está pedindo...". Ele disse:
"Mas não tem como, nesse momento não tem como, tem que treinar
melhor". Recusei a luta, me ofereceram uma grana muito boa, e fui testado
na minha ganância. Se entro ali e faço a luta, ganhando ou perdendo ia receber
a bolsa, mas isso não seria justo, nem comigo e nem com meus fãs. Demorou tanto
tempo para ter esse legado e todas as pessoas que me seguem! Tenho que estar,
no mínimo, em condições de fazer uma boa apresentação para vocês, e é isso que
vou fazer agora no sábado.
Bellator 180
24 de junho, em Nova York (EUA)
CARD DO EVENTO:
Peso-meio-pesado: Wanderlei Silva x Chael Sonnen
Peso-pesado: Fedor Emelianenko x Matt Mitrione
Peso-meio-médio: Douglas Lima x Lorenz Larkin
Peso-leve: Michael Chandler x Brent Primus
Peso-leve: Aaron Pico x Zach Freeman
Peso-meio-pesado: Phil Davis x Ryan Bader
Peso-pena: James Gallagher x Chinzo Machida
Peso-meio-médio: Neiman Gracie x Dave Marfone
Peso-mosca: Heather Hardy x Alice Yauger
Peso-meio-médio: Ryan Couture x Haim Gozali
Peso-leve: Jerome Mickle x Anthony Giacchina
Peso-meio-médio: John Salgado x Hugh McKenna
Peso-galo: Matt Rizzo x Sergio da Silva
Peso-leve: Bradley Desir x Nate Grebb