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Eurodeputados portugueses criticam falta de transparência no acordo de comércio Europa-EUA

Eurodeputados revelam "condições draconianas" e "devidamente policiadas" em que podem aceder a alguns documentos das negociações para o acordo de comércio.

Miguel Baltazar/Negócios
André Cabrita-Mendes andremendes@negocios.pt 28 de Março de 2015 às 10:00

A falta de transparência nas negociações entre Bruxelas e Washington para um acordo de comércio foi criticada por vários eurodeputados portugueses.

 

O Tratado Transatlântico de Comércio e Investimento (TTIP, na sigla em inglês) está a ser negociado há dois anos entre a Comissão Europeia e o Governo norte-americano e pode ficar fechado ainda este ano.

 

A primeira crítica partiu da eurodeputada Marisa Matias num debate sobre ambiente e energia na conferência "TTIP: diálogo entre parceiros" esta sexta-feira, 27 de Março, em Lisboa.

 

"Esta naturalização de que um acordo desta dimensão e desta natureza pode ser feito em secretismo, ou de que o que é importante para as nossas vidas pode ser discutido por um grupo de técnicos que não prestam rigorosamente contas a ninguém - nem eleitos nem quem elege -, é das coisas que mais me choca neste processo todo", disse a eurodeputado do Bloco de Esquerda.

 

Marisa Matias (na foto) está a acompanhar de perto o TTIP. É que além de ser relatora permanente do acordo para o Parlamento Europeu, também é coordenadora do seu grupo parlamentar - o Grupo Confederal da Esquerda Unitária Europeia/Esquerda Nórdica Verde - na comissão de assuntos económicos e monetários.

 

Confessou que, apesar de estar a acompanhar o processo, ainda não teve autorização por parte da Comissão Europeia para aceder a uma sala com documentos cruciais para a negociação do acordo. "Eu até hoje ainda não tive acesso à sala de leitura. E já me manifestei em frente à sala".

 

E mesmo que tivesse acesso a esta sala, existem várias restrições para poder consultar a documentação. "Não se pode entrar nem com o telemóvel porque faz fotografia, não se pode sequer levar lápis, não se pode tirar notas e só se pode ler algumas coisas. Temos que ir lá controlados e com o tempo limitado, nós [que somos] representantes dos cidadãos".

 

Os eurodeputados podem assistir às reuniões de preparação das negociações, mas com acesso limitado a documentos. "E o que é que temos acesso nessas reuniões? Às ordens de trabalhos. Obrigado, mas nós gostávamos de ter acesso aos conteúdos".

 

"Todo o acesso que eu tenho é este. Não é uma caricatura. Eu até queria que fosse uma caricatura porque não me sentia rídicula de vez em quando", admitiu a eurodeputada do Bloco de Esquerda.

 

A descrição de Marisa Matias foi corroborada pelo eurodeputado João Ferreira. "Os deputados no parlamento europeu tem acesso muitíssimo condicionado aos documentos".

 

O eurodeputado comunista descreveu as "condições draconianas" em que os membros do Parlamento Europeu podem aceder aos documentos. "Devidamente policiados, com a garantia que não levam nada, nem uma folha de papel ou um telemóvel que possam servir para retirar o que quer que seja".

 

Outro eurodeputado presente no debate, o socialista Carlos Zorrinho, apontou que apesar dos "níveis de transparência terem aumentado um pouco", reconheceu que os mesmos "ainda são relativamente reduzidos."

 

Eurodeputados divergem sobre o acordo de comércio Europa-EUA

 

Relativamente ao acordo de comércio em si, os eurodeputados divergiram nas suas opiniões. Carlos Zorrinho defendeu a necessidade de aprovar o TTIP, enquanto Marisa Matias e João Ferreira deixaram vários alertas sobre os riscos da sua aprovação.

 

Marisa Matias sublinha que existe um discurso contraditório por parte da Comissão Europeia. Por um lado, as barreiras tarifárias já são mínimas, e, por outro, a regulação sobre as barreiras não tarifárias já está coberta por outros tratados.

 

"Sobre o que está em jogo, se não são as barreiras tarifárias, e se também não são as barreiras não tarifárias, então para que é que se está a fazer isto tudo? Eu gostava que se abrisse o jogo", afirmou a deputada bloquista.

 

Sobre o acordo para a energia sublinhou que a aposta no gás de xisto vai fazer a União Europeia recuar vários anos em termos de avanços nas energias renováveis e fontes renováveis de energia. "O mundo tem recursos limitados, escassos, a pior coisa que se pode imaginar é que liberalizar as matérias primas nos vai trazer algo de bom".

 

Para Carlos Zorrinho, este acordo é a "grande oportunidade de integrar na globalização algumas preocupações europeias" e que, no futuro, vai-se tornar num "acordo de referência para regular toda a globalização".

  

"Há um grande entusiasmo por esta parceria" que vai criar uma nova plataforma para tornar a União Europeia "líder do ponto de vista energético", defendeu. Na área energética, o eurodeputado socialista sublinhou que a prioridade são as "energias renováveis, mas numa visão integrada".

 

Por seu turno, João Ferreira apontou que os níveis ambientais da União Europeia poderão sofrer uma desvalorização com este acordo. Também criticou a possibilidade de introdução de tribunais arbitrais, que deram maus resultados no sector energético na Alemanha, no Canadá e na América Latina. Ao mesmo tempo, o eurodeputado comunista sublinhou que a exploração de gás de xisto na Europa vai "criar condições mais díficeis para as energias renováveis".

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