RIO- Cássia Moreira responde sem titubear o que gostaria de fazer da vida: “ser professora”. Questionada sobre o motivo, também diz rapidamente: “queria aprender coisas novas e passá-las para outras pessoas”. Tal fé na educação vem de uma jovem de 19 anos que abandonou a escola no ano passado — quando ainda cursava a 8ª série — depois que seu filho mais novo nasceu com um problema respiratório. Fora da escola e sem concluir o ensino médio até os 19 anos, Cassia fará parte de uma estatística que já preocupa. Segundo estudo divulgado nesta quarta-feira pelo Movimento Todos Pela Educação, com base na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) cerca de 41,5% dos jovens de 19 anos não haviam terminado a etapa em 2015. Para piorar o cenário da educação pública, outros 2,4 milhões de crianças e jovens de 4 a 17 anos estavam fora dos bancos escolares no mesmo período.
— Quando meu filho melhorar, eu gostaria de voltar a estudar e ir até pelo menos o ensino médio. Eu sonho que meus filhos façam faculdade e andem para frente — afirma a jovem, que engravidou do primeiro filho aos 15 anos e vive em uma casa de apenas um cômodo com mais nove pessoas.
De acordo com a pesquisa, embora o Brasil esteja melhorando os índices gradativamente, ainda não é capaz de resolver os problemas na velocidade necessária para alcançar as metas esperadas. Para 2015, o Todos Pela Educação estabeleceu que 96,3% das crianças e jovens brasileiros de 4 a 17 anos deveriam estar na escola, mas, na realidade, a taxa ficou em 94,2%. Embora tenha evoluído em relação a 2005, quando o percentual era de 89,5%, o crescimento lento desapontou especialistas.
— A grande frustração de quem está na maior batalha para que educação melhore é verificar que não basta ter uma lei que determina matrícula obrigatória de 4 a 17 anos. Temos uma lei, mas não tivemos nenhum aumento de esforço por parte dos estados e municípios para fazê-la ser cumprida — critica a presidente-executiva do Todos Pela Educação, Priscila Cruz. — Nossa política pública ainda é muito voltada para uma medida que resolve tudo. Para incluir os que estão fora temos que, não só prover vagas na escola e professores, mas fazer uma busca ativa, identificar porque não estão se matriculando. No caso do jovem, tem muito a ver com aquele que chegou a entrar no sistema, acabou saindo, e não quer mais voltar.
Os dados mostram que, embora o índice de matrículas de crianças de 4 e 5 anos tenha crescido muito, passando de 72,5%, em 2005, para 90,5% em 2015, o baixo progresso no atendimento da faixa etária de 15 a 17 anos — passando de 78,8% para 82,6% no mesmo período — contribuiu para que o aumento da taxa geral de crianças e jovens na escola não crescesse o suficiente.
Segundo Eduardo Deschamps, presidente do Conselho Nacional de Educação, o crescimento tímido nas matrículas de 15 a 17 anos são reflexo da falta de atratividade do ensino e das deficiências ao longo da escolarização:
— Boa parte da evasão se dá por um modelo que não gera valor para o estudante. Muito dos que estão fora da escola, estão devido a problemas do próprio ensino fundamental. Para muitos a alfabetização não é adequadamente realizada e o aluno entra em desvantagem nos anos finais, que é uma etapa importante na transição. O ensino médio é focado em quem vai direto para universidade e deixa de lado outros interesses.
Esses fatores combinados também fazem com que grande parte dos jovens não conclua o ensino médio até os 19 anos. A pesquisa mostra que em 2005 apenas 41,4% dos jovens de 19 anos haviam se formado na etapa. Em 2015, o índice era de 58,5%, muito abaixo da meta estabelecida pelo Todos Pela Educação de 74,5%.
RESULTADOS FRUSTRANTES
Além do abandono e atraso escolar, o caso Cássia é exemplo de um grupo específico: mulheres que se tornam mães na adolescência. A pesquisa mostra que entre as meninas de 10 a 17 anos que tiveram filhos, apenas 28,6% estudavam em 2015. O percentual de meninas que só estudavam era bem maior entre as que não tiveram filhos: 89%. Por outro lado, as mães eram maioria entre a população de 10 a 17 anos que não estudava e nem trabalhava, os chamados “nem-nem”, com taxa de 57,2%. Entre as que não têm filho e compõem a mesma faixa etária, o percentual de “nem-nem” é de 3,9%.
— Os resultados são frustrantes. É um absurdo, uma vergonha. Tendo convicção desse diagnóstico, o Ministério pensou a reforma do ensino médio para oferecer uma alternativa aos jovens e torná-lo interessante. Também fazemos a oferta de curso técnico no contraturno para aluno do ensino médio. São duas medidas fundamentais para combater a evasão — afirmou a secretária-executiva do MEC, Maria Helena Guimarães. — Com relação à preparação dos alunos , estamos encaminhando amanhã a Base Nacional Comum, que fará isso de maneira adequada nos anos finais do ensino fundamental, para que eles cheguem mais bem preparados ao ensino médio.