Edição do dia 16/03/2016

16/03/2016 06h08 - Atualizado em 16/03/2016 06h26

Delcídio do Amaral entrega gravação onde Mercadante oferece 'ajuda'

Gravação revela conversa entre Mercadante e o assessor de Delcídio.
Mercadante diz para Delcídio não se precipitar e não desestabilizar tudo.

Cláudia BomtempoBrasília

A delação de Delcídio do Amaral trouxe um ingrediente extra, que surpreendeu muita gente: uma gravação onde o ministro da Educação, Aloizio Mercadante, se oferece para ajudar a resolver os problemas do senador.

Os detalhes da delação do senador Delcídio do Amaral começaram a circular em Brasília logo cedo e botaram fogo no mundo político. Delcídio envolve o ministro da Educação, Aloizio Mercadante, em uma suposta tentativa de compra de silêncio.

Ele entregou aos procuradores da Lava Jato uma gravação feita por um dos seus assessores mais próximos, Eduardo Marzagão, em uma conversa com Mercadante. As gravações foram reveladas primeiro no site da revista Veja.

Em um trecho, o ministro Aloizio Mercadante diz ao assessor que quer ajudar Delcídio e que o senador não deve se precipitar porque pode desestabilizar tudo.

"Eu acho que ele devia esperar e não fazer nenhum movimento precipitado porque ele já fez o movimento errado. Deixa baixar a poeira, que vai sair uma confusão muito grande pro país. Pra ele não ser o agente que desestabilize tudo. Senão vai sobrar uma responsabilidade pra ele monumental, entendeu?", disse Mercadante na gravação.

Nos depoimentos à Procuradoria-Geral da República, Delcidio disse ter entendido que Mercadante fez uma "ameaça velada" ao dizer que ele seria um "agente de desestabilização", se firmasse acordo de delação premiada.

Na gravação, Mercadante elogia Delcídio, diz que ele segurou várias broncas do PT. E promete falar com o presidente do Senado, Renan Calheiros, para construir uma saída junto ao Supremo que permitisse suspender a prisão de Delcídio. Mercadante se colocou à disposição para ajudar.

"Eu acho que se a gente não for pelo jurídico, pelo político, pelo bom senso, vai sair só bateção de cabeça. Porque eu posso tentar ajudar nisso aí no Senado. Vou tentar conversar com o Renan e ponderar a ele de construir uma, entendeu? Uma moção", afirma Mercadante na gravação.

O ministro também disse que iria falar com o presidente do Supremo Tribunal Federal.

Aloizio Mercadante: Não, não, mas o presidente vai ficar no exercício. Também precisa conversar com o Lewandowski. Eu posso falar com ele pra ver se a gente encontra uma saída. Mas eu vou, eu vou falar com o ministro no Supremo também.
Eduardo Marzagão: Complicado.
Aloizio Mercadante: Mas é o seguinte, eu não tenho nada a ver... o Delcídio... Zero... Não tô nem aí se vai delatar, não vai delatar, não tô nem aí... A minha, a minha questão com ele é que eu acho um absurdo o que aconteceu com ele.

E ofereceu ajuda no que o senador precisasse.
Eduardo Marzagão: Só pra você ter uma ideia, eles estão vendendo a casa.
Aloizio Mercadante: Pra não ficar expostos.
Eduardo Marzagão: Não, até pra...
Aloizio Mercadante: Arrecadar dinheiro.
Eduardo Marzagão: Arrecadar dinheiro. Os carros, a casa. A fazenda, porque é da mãe e do irmão, então lá não vai mexer. Aliás, o irmão está vindo aí pra tratar desses assuntos. Assuntos financeiros mesmo.
Aloizio Mercadante: Patrimônio da família.
Eduardo Marzagão: Patrimônio, as dívidas que ele tem. Pra você ter uma ideia da situação dele, o salário dele tem consignado. O salário do Delcídio tem empréstimo consignado, que ele está pagando.
Aloizio Mercadante: Bom, isso aí também a gente pode ver no que é que a gente pode ajudar, na coisa de advogado, essa coisa. Não sei. Pô, Marzagão, você tem que dizer no que eu posso ajudar. Eu só to aqui para ajudar. Veja o que que eu posso ajudar.

Nos depoimentos, Delcidio contou aos investigadores como interpretou as conversas do ministro com seu assessor. Entendeu "que a mensagem de Aloizio Mercadante, a bem da verdade, era no sentido do depoente não procurar o Ministério Público Federal. E que sabe dizer que, em dado momento, Eduardo Marzagâo mencionou que o depoente e sua família estavam gastando dinheiro com advogados e, para tanto, colocando imóvel a venda; naquele momento, Aloizio Mercadante disse que a questão financeira e, especificamente, o pagamento de advogados, poderia ser solucionado, provavelmente por meio de empresa ligada ao PT.

Delcídio disse ainda que Aloizio Mercadante é um dos poucos que possui a confiança de Dilma Rousseff, tendo afirmado, inclusive, que "se ela tiver que descer a rampa do Planalto sozinha, ele descerá ao lado dela". E que, em razão disso, Delcídio entende o depoente que Aloizio Mercadante agiu como emissário da presidente da República e, portanto, do governo.

Em nota, o presidente do Supremo Tribunal Federal, Ricardo Lewandowski, declarou que jamais manteve qualquer tipo de conversa nos termos citados no depoimento. Lewandowski afirmou também que, como chefe do Poder Judiciário, o presidente do STF zela pela independência e pela imparcialidade do exercício da magistratura.

A gravação entre Aloizio Mercadante e um assessor de Delcídio do Amaral provocou um terremoto no Palácio do Planalto. A presidente Dilma convocou uma reunião de emergência e mandou que Mercadante explicasse toda a história, conforme mostra o vídeo com a reportagem completa.

Mesmo depois das explicações do ministro, a presidente Dilma divulgou uma nota. Repudiou com veemência e indignação a tentativa de envolvimento do nome dela na iniciativa pessoal de Aloizio Mercadante.

A delação de Delcídio do Amaral também repercutiu no Congresso Nacional. Governo e oposição se enfrentaram, mais uma vez, e o tema não poderia ser outro: o impeachment da presidente Dilma, como conta o jornalista Heraldo Pereira.

 

 

veja também