Rio

A um mês dos Jogos, vila olímpica em favela fechou as portas por falta de dinheiro

Prefeitura disse que organização que cuida do local terá que retomar pagamentos
Em 2012, na Vila Olímpica, Phelps deu um estímulo para pequenos nadadores. Em 2016, sem dinheiro, as aulas da escolinha foram suspensas
Foto: Ivo Gonzalez (30/10/2012)
Em 2012, na Vila Olímpica, Phelps deu um estímulo para pequenos nadadores. Em 2016, sem dinheiro, as aulas da escolinha foram suspensas Foto: Ivo Gonzalez (30/10/2012)

RIO — A alguns quilômetros de distância de piscinas e arenas que vão receber deuses do esporte, há um complexo olímpico modesto, invisível à demanda por instalações impecáveis. Com banheiros sujos e grama sintética desgastada, a Vila Olímpica Carlos Castilho, mais conhecida como a Vila Olímpica do Alemão, tem pouco em comum com os Jogos que a batizam, a não ser a cidade onde os dois estão. Neste mês, por falta de manutenção e de pagamento de funcionários, suas instalações foram fechadas. Desde o último dia cinco, a exato um mês do dia em que a pira olímpica iluminará a cidade, as luzes das salas de aula da vila, que recebe principalmente crianças e idosos de favelas dos Complexos do Alemão e da Penha, estão apagadas.

Moradores afirmam que desde que foi inaugurado, em 2002, o local não passou por uma única reforma. A situação parece ter se agravado, segundo eles, nos últimos meses. Trabalhadores da unidade, a maioria moradores do morro, estão com salários atrasados. Falta também dinheiro para a manutenção de equipamentos e instalações. Segundo o portal local Voz da Comunidade, nem copos e papel higiênico as salas da vila vinham recebendo.

— A Vila Olímpica é administrada por uma organização social, que repassa o dinheiro da prefeitura para os funcionários e há algum tempo o local tem estado em crise. Tem época que os funcionários ficam sem receber, tem época que fica sem manutenção. É um total abandono do poder público. É muito triste ver a vila assim. Além de enfrentar a violência entre a polícia e o poder paralelo, o morador ainda enfrenta a violência do próprio município — lamenta Lúcia Cabral, moradora do Alemão e fundadora do projeto social Educap, que atende crianças da comunidade e costuma utilizar algumas instalações da Vila Olímpica para seus eventos.

Segundo Lúcia, a vila era uma espécie de refúgio em um terrirório sofrido, marcado pela violência que tem se intensificado nos últimos anos. Lá, enquanto crianças com necessidades especiais ganhavam a piscina, as quadras serviam para torneios e aulas para crianças do morro. Havia também atividades voltadas para os jovens, como cursos profissionalizantes e de empreendedorismo. Além de reuniões comunitárias de moradores e ações de saúde. Neste mês de férias escolares, a Vila Olímpica do Alemão costumava ser um alívio para as mães, que podiam deixar os pequenos em segurança em uma colônia de férias.

— No meio de tanta violência, era um espaço que tinha tanta coisa boa. Qualquer coisa que a comunidade precisasse, a Vila Olímpica era parceira. Os profissionais de lá fazem o que podem, mas a vila não deve ter tido manutenção desde que foi inaugurada — ressaltou Lúcia.

Em nota, o secretário Municipal de Coordenação de Governo, Rafael Picciani, esclareceu que a prefeitura vai pressionar a organização que administra a vila para que os pagamentos sejam regularizados. “A Prefeitura está tomando as providências para que a Organização Social (OS) que atua no local regularize o pagamento de seus funcionários, para que as atividades da Vila Olímpica sejam retomadas à sua normalidade. Me cabe esclarecer, também, que trata-se de serviço terceirizado e não de servidores do município”, disse.

A vila foi inaugurada em 2002, pelo então prefeito Cesar Maia, em um terreno que pertencia à Comlurb. O local já viveu seus bons dias. Em 2012, o medalhista americano Michael Phelps dividiu as raias com crianças da escolinha de natação, para a alegria dos pequenos. Pelo menos até o ano passado, quando, em junho, O GLOBO esteve nas suas instalações, a vila exibia uma faixa saudando o campeão. Mas já há um ano, o local sofria com os atrasos de pagamento de funcionários e a piscina, cheia de lodo, estava fechada.

Segundo o Voz da Comunidade, cerca de 50 pessoas trabalham no local, entre professores, seguranças e funcionários da limpeza. Todos eles estariam sem receber desde o mês de maio. Cerca de mil pessoas frequentam a vila por dia, que, de acordo com o portal, tem 2.293 alunos divididos por 30 modalidades, entre todas as idades. Até que a vila volte à sua rotina, para esses moradores, quase nada haverá de olímpico ao redor.

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