Por Luiza Tenente, G1


Tudo de novo? Especialistas explicam o que fazer ao receber a notícia da reprovação — Foto: Luiza Tenente/G1

Fim de ano e os pais escutam: “seu filho foi reprovado”. A sensação, nesse momento, pode ser de fracasso, de medo, de vergonha. Os especialistas recomendam, no entanto, que a família dê apoio ao jovem e concentre-se, apesar da tristeza, em encontrar uma explicação para o aluno ter repetido de ano.

“A notícia não deve ser surpreendente nem para os pais, nem para o filho. Caso todos estejam unidos, a reprovação vai ser compreendida: ela é o resultado de um ano inteiro”, afirma Rita Calegari, psicóloga do Hospital São Camilo (SP). “Se os adultos mostrarem ao adolescente que é uma oportunidade de consolidar o aprendizado e de entender melhor os conteúdos, a pressão negativa vai ser menor”, completa.

Faz parte da missão da escola sinalizar ao longo do ano letivo que o aluno está com alguma dificuldade de acompanhar as aulas. “Lá é onde estão os especialistas. Nem sempre a família, envolvida emocionalmente com o filho, consegue perceber o que está havendo. É a união entre os pais e a equipe pedagógica que deve ajudar a investigar e a os aspectos que podem ter levado à reprovação – sejam eles cognitivos ou emocionais”, explica a psicopedagoga e orientadora educacional Jane Rapoport, do Colégio Dínamis (RJ).

Boletim no fim do ano pode trazer má notícia — Foto: Luiza Tenente/G1

As causas variam: um problema de saúde na família, separação dos pais e bullying são exemplos que podem interferir na dedicação e na concentração do aluno. “O diagnóstico precisa ser muito completo. Em alguns casos, o conselho de classe pode optar por passar a pessoa de ano por ter sido um problema temporário, que é possível de ser revertido. As análises são individuais”, diz Calegari.

Seja qual for a razão encontrada para explicar a reprovação, é importante que a família e a escola se esforcem para afastar o preconceito de que quem repete de ano é “burro ou incapaz”. A autoestima do adolescente, nesse momento, depende muito da postura dos pais.

“O jovem erra e precisa ser acolhido por quem o ama. Ficar chateado é esperado, mas decepcionado é pior. Qualquer pessoa que fracasse e seja recebida com desdém ou raiva vai carregar aquilo. Ver que os pais estão decepcionados é de uma dor imensa para o filho. Pior do que repetir de ano é perceber a falta de apoio”, complementa a psicóloga.

José*, de 16 anos, está refazendo o 1º ano do ensino médio em um colégio particular de São Paulo. A principal recordação do jovem, ao falar da reprovação, é a falta de suporte. “Eu tenho muita dificuldade em exatas. Meus pais foram chamados na escola durante o ano, mas nunca me apoiaram nem me incentivaram a estudar”, diz.

“Meu pai está sempre trabalhando e minha mãe só brigou comigo, disse que sentiu vergonha de mim. Foi uma das piores sensações da minha vida”, conta. “Os familiares devem ajudar o filho a superar o que ocorreu.”

Alguns pais têm a preocupação de que o apoio ao jovem nesse momento seja entendido como conivência, “passar a mão na cabeça” do adolescente. “O apoio não precisa vir separado do aprendizado. O aluno deve entender que seus atos produzem consequências. Se não se empenhou, não se comprometeu, protelou as tarefas, vai precisar refazer seu ano letivo. A reprovação pode ser didática”, explica Rita Calegari.

E no ano seguinte? — Foto: Luiza Tenente/G1

Raquel Lazzari, professora do departamento de educação da Unesp de Assis, afirma que não adianta que a escola repita as mesmas práticas do ano anterior. “Não dá para manter a mesma metodologia, se já não funcionou uma vez. Tem de oferecer novas opções para o aluno, como reforços paralelos, recuperação. A não ser que a reprovação tenha ocorrido por excesso de faltas”, diz. “Se fizer tudo do mesmo jeito, o estudante vai reprovar de novo. Sem possibilidades novas, fica difícil.”

Mudar de escola é solução? — Foto: Luiza Tenente/G1

Márcia Oliveira* é mãe de Gabriela*, de 19 anos, que foi reprovada no 1º ano do ensino médio, quando tinha 15 anos. O sonho da família era que a menina pudesse estudar em um tradicional colégio do Rio de Janeiro. Quando conseguiu uma bolsa de estudos, matriculou a filha. “Eu julgava que fosse um colégio mais forte, que seria bom para ela. Mas aprendi que é preciso conhecer o limite do seu filho e ver que nem sempre a escola mais cara ou mais difícil vai ser a melhor para ele”, conta Márcia.

No caso dela, a preocupação do colégio era manter apenas os alunos com as maiores notas. Não havia, de acordo com Márcia, alguma política de apoio para que o estudante que tivesse um desempenho ruim pudesse tentar melhorar. Diante da reprovação, Gabriela teve depressão e começou a se automutilar.

“A fase da adolescência já é difícil, então, como mãe, não indico trocar o filho de escola porque ele perdeu o ano. Mas precisa analisar a situação com cuidado. No caso da minha filha, não tivemos outra opção: mudei a Gabi de escola. Foi horrível, porque era um colégio que não estava disposto a ajudá-la, não teria como mantê-la lá”, conta. Atualmente, a menina está terminando o ensino médio em outra instituição de ensino e tenta uma vaga na faculdade de arquitetura.

Geovanna Santos foi reprovada duas vezes na escola pública e preferiu não mudar de colégio — Foto: Arquivo pessoal

Já Geovanna Santos, de 20 anos, foi reprovada duas vezes no 1º ano do ensino médio – e permaneceu no mesmo colégio, onde atualmente cursa o 3º ano. Ela explica que, na primeira vez, não foi aprovada pelo excesso de faltas, e na segunda, pelas notas baixas. “Eu quis chorar, porque ver minhas amigas dois anos à frente foi muito ruim. Aprender a mesma matéria pela terceira vez também fez as coisas ficarem desinteressantes”, conta. “Mas nunca quis mudar de escola: pelo menos eu conhecia pessoas novas e já estava acostumada com os professores”, diz.

Rita Calegari explica que não há, de fato, uma resposta certa sobre trocar ou não de colégio. “Tem pais que mudam e outros não. Se o motivo da reprovação é falta de dedicação, não adianta tirar de uma escola. Mas se o colégio estiver aquém de ajudar o jovem, ou se o aluno não se adaptar ao método pedagógico, a mudança pode ajudar”, diz.

A orientadora educacional Rapoport complementa: “A mudança de escola, no caso da reprovação, deve acontecer quando a família, escola e especialistas (caso a criança tenha) concordem que o aluno terá ganhos com a troca. Às vezes, é o caso de refazer laços sociais ou procurar outra metodologia”, diz.

O que os pais podem fazer durante o ano para evitar a reprovação? — Foto: Luiza Tenente/G1

É claro que o ideal é evitar a reprovação e detectar os problemas antes do fim do ano. A professora da Unesp afirma que as avaliações poderiam ajudar na tarefa, caso fossem adequadas. “O professor precisa ver por que o aluno não aprendeu, se a metodologia está boa. Para se pensar em reprovação, precisa ver que tipo de avaliação se está fazendo. Nota não é só para classificação: é para reflexão, para feedback”, declara.

E os pais, quando chamados para as reuniões durante o ano, devem levar os encontros como uma oportunidade de discutir os problemas reais do aluno e as soluções possíveis. “A escola não pode ficar restrita só ao ‘seu filho é malcriado’, etc. As reuniões precisam discutir práticas pedagógicas e acompanhar a evolução do jovem ao longo do ano”, explica.

*Os nomes originais foram trocados por fictícios a pedido dos entrevistados.

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